Por: Cleiton Jesus Matos
Discente | Filosofia | UESB
Em O Mal-Estar na Civilização, Sigmund Freud apresenta uma análise profunda sobre as tensões entre a individualidade humana e as demandas da civilização. A obra revela como a cultura, enquanto sistema de controle social, impõe restrições aos instintos naturais (pulsões), levando os indivíduos a experimentar um mal-estar psicológico. Essa relação complexa entre a sociedade e a psique humana é estruturada em torno de vários conceitos-chave que ajudam a entender o sofrimento inerente à vida civilizada.
Freud argumenta que a civilização exige a repressão de instintos fundamentais, especialmente os instintos sexuais e agressivos. Essa repressão é necessária para a convivência pacífica, mas gera um conflito interno significativo. O indivíduo, forçado a silenciar suas pulsões naturais, enfrenta um estado de tensão constante entre o desejo e a realidade. Essa luta interna, por sua vez, culmina em sentimento de culpa e ansiedade, manifestados pela internalização das normas sociais que regem a vida em comunidade. A consciência moral, formada por essa repressão, provoca uma sensação de mal-estar que permeia a experiência humana na civilização, nesse sentido ele diz que:
Com metas mais modestas, segue-se o mesmo caminho quando apenas se aspira ao domínio sobre os impulsos. O que então domina são as instâncias psíquicas superiores que se submeteram ao princípio da realidade. Isso não significa de modo algum que se renunciou ao propósito de satisfação; uma certa proteção contra o sofrimento é alcançada pelo fato de a não satisfação dos impulsos mantidos sob sujeição não ser sentida tão dolorosamente como a dos impulsos livres. (FREUD, 2010, P. 68)
Além disso, Freud examina o papel da religião como uma tentativa de lidar com o sofrimento e o desconhecido. Ele vê a religião como uma ilusão reconfortante que, embora ofereça uma forma de consolo frente às ansiedades existenciais, pode limitar o desenvolvimento intelectual e emocional do ser humano. Essa relação ambígua com a religião exemplifica a busca incessante do ser humano por segurança e sentido em meio às frustrações impostas pela cultura e, dentro deste contexto, no capítulo II ele faz a seguinte colocação:
O homem comum não consegue imaginar essa providência de outro modo a não ser na pessoa de um pai grandiosamente elevado. Somente um pai assim é capaz de conhecer as necessidades da criança humana, compadecer-se com suas súplicas, apaziguar-se com os sinais de seu arrependimento. Isso tudo é manifestação infantil, tão alheio à realidade, que se torna doloroso para uma mentalidade humanitária pensar que a grande maioria dos mortais nunca poderá se elevar acima dessa concepção de vida. (FREUD, 2010, p. 58)
A busca por prazer, central na psicologia freudiana, é outra dimensão crucial da análise. Freud sugere que, enquanto o prazer é uma força motriz na vida humana, a civilização frequentemente transforma essa busca em sofrimento. A necessidade de conciliar os desejos individuais com as exigências sociais cria um ambiente de frustração, onde o prazer é frequentemente postergado ou negado. Essa dinâmica revela como a cultura, apesar de oferecer proteção e estrutura, também demanda sacrifícios pessoais, gerando um mal-estar que é, em última análise, uma característica da condição humana.
Por fim, Freud se questiona sobre o futuro da civilização diante dessas tensões. Ele sugere que a saúde da cultura depende da capacidade de encontrar um equilíbrio entre a satisfação das pulsões individuais e as exigências sociais. Essa reflexão revela uma preocupação com a viabilidade da civilização em promover o bem-estar do indivíduo, ao mesmo tempo em que mantém a ordem social.
REFERÊNCIAS
FREUD, S. O mal-estar na cultura, Rio de Janeiro: L&PM Editores, 2010.
Tremedal-BA, 23 de julho de 2025.
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