Por: Cleiton Jesus Matos
Discente | Filosofia | UESB
O que é a felicidade? Sem dúvidas, esta é uma pergunta que há muito tempo paira na mente humana. Mas o que de fato esta questão implica não é somente a definição da referida mas: Como alcançá-la?
Neste texto, faço breves considerações sobre a perspectiva aristotélica em torno dessa problemática.
Aristóteles parte da convicção de que todo ser humano realiza suas ações em busca de algum bem, mas que existe um bem final, desejado por si mesmo, e não como meio para outra coisa. Esse bem supremo é a eudaimonia, que, segundo ele, melhor corresponde a uma vida bem vivida, plena e virtuosa. Diferentemente de modos de vida voltados ao prazer ou à honra e ao reconhecimento público, estratégias que visam a ganhos temporários ou externos, a eudaimonia é autossuficiente, completa em si mesma e baseada na prática constante da virtude. Isso, por óbvio, é uma questão tratada no livro Ética a Nicômaco, deixo aqui algumas palavras do próprio autor:
Admite-se geralmente que toda arte e toda investigação, assim como toda ação e toda escolha, têm em mira um bem qualquer; e por isso foi dito, com muito acerto, que o bem é aquilo a que todas as coisas tendem. Mas observa-se entre os fins uma certa diferença: alguns são atividades, outros são produtos distintos das atividades que os produzem. Onde existem fins distintos das ações, são eles por natureza mais excelentes do que estas. (ARISTOTELES, 1991, p.09).
Novamente, todas as ações humanas visam um bem, mas estas ações são meios para o alcance do bem último, aquele que basta em si mesmo, isto é, a felicidade. Alguns exemplos citados por Aristóteles que são meios: a arte médica é meio para a saúde, o da construção naval é o navio, o da estratégia é a vitória e o da economia é a riqueza. Ora, todos estes exemplos, no final das contas buscam o alcance do bem último, supremo: a felicidade. Ou você teria uma resposta para a pergunta: Ser feliz para que?
A virtude, na visão aristotélica, representa excelência moral ou intelectual, e encontra seu lugar no chamado “caminho do meio” o equilíbrio entre extremos viciosos. Por exemplo, a coragem é situada entre a temeridade, que é excesso, e a covardia, que é deficiência; o mesmo princípio se aplica à generosidade, à ambição ou à temperança. A prática da virtude não é algo natural ou inato: ela se firma por meio de hábitos e escolhas repetidas, apoiadas pela capacidade humana de deliberar corretamente, o que Aristóteles chama de phronesis, ou prudência prática.
A razão desempenha papel central nesse percurso. O ser humano se distingue dos demais seres por sua natureza racional, e uma vida feliz é aquela que exerce a racionalidade de forma plena. Citando mais uma vez a Ética a Nicômaco, No Livro X, Aristóteles propõe que a vida contemplativa, isto é, uma existência dedicada à busca do conhecimento, da verdade e da sabedoria, é a forma de viver mais elevada e duradoura. Nesse modo de vida, não se busca o prazer sensorial, mas se cultiva uma atividade da alma conformada à virtude em sua forma mais pura.
Entretanto, Aristóteles não ignora os bens externos como saúde, riqueza, amizade, reputação que, ainda que secundários, são reconhecidos como condições que ajudam a manter a eudaimonia. Ele ressalta que ninguém pode ser plenamente feliz se estiver isolado ou carente de relações sociais: o homem, para ele, é um “animal político”, e a vida em comunidade fornece o terreno em que se cultivam as virtudes. A amizade, em particular, é considerada indispensável, ninguém escolheria viver sem amigos, mesmo que possuísse todos os outros bens.
A eudaimonia, então, não é uma condição estática ou um estado emocional, mas como afirma Aristóteles, “a felicidade é uma atividade da alma de acordo com a virtude perfeita”. Esse é um esforço permanente, que exige do ser humano, maturidade, bom caráter e participação na vida da polis. A educação tem papel essencial nesse processo, pois os hábitos virtuosos devem ser cultivados desde cedo para que o caráter se firme e se torne resistente às adversidades.
Embora Aristóteles defenda que a vida contemplativa é a mais alta expressão da eudaimonia, ele entende que essa forma de viver nem sempre é acessível a todos, por depender de disponibilidade de tempo e circunstâncias favoráveis. Porém, ele mostra que a prática da virtude, mesmo em contextos comuns, pode proporcionar uma vida genuinamente feliz, pois envolve agir bem, deliberar bem, tocar o mundo por meio de ações éticas e relacionamentos virtuosos.
Nesse sentido, a felicidade segundo Aristóteles é muito mais do que um estado efêmero: é o executar contínuo e virtuoso da razão em ações equilibradas, construídas na convivência com outros e na reflexão moral constante.
Tremedal-BA, 25 de julho de 2025.
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