segunda-feira, 28 de julho de 2025

AS CINCO VIAS DE TOMÁS DE AQUINO PARA PROVAR A EXISTÊNCIA DE DEUS

 


Por: Cleiton Jesus Matos
Discente | Filosofia | UESB

Na história da filosofia e da teologia cristã, poucos nomes têm tanto peso quanto o de Tomás de Aquino. Vivendo no século XIII, o "boi mudo" buscou realizar algo não muito aconselhável para a época, unir a fé cristã a razão filosófica, sobretudo a filosofia de Aristóteles, pensador a quem Tomas de Aquino era "devoto". Uma das partes mais conhecidas de sua obra Suma Teológica é a apresentação das chamadas “cinco vias", isto é, cinco argumentos sob a luz da razão que visam demonstrar a existência de Deus observando o mundo sensível. Diferente de uma fé cega, irracional e mística, Tomas parte da experiência concreta para alcançar uma conclusão metafísica: a existência de um ser supremo e ordenador de todas as coisas. Enfim, pretendo nos próximos comentários elencar e nomear o nome de cada via, fazendo uma breve explicação sobre, mas dando prioridade ao que o próprio Tomas de Aquino escreveu.

A primeira via: O movimento

A primeira via é baseada no movimento, compreendido como a passagem da potência ao ato, exemplo: a semente é uma potência, a árvore com seus frutos é o ato. Tomás observa que tudo que se move é movido por algo, e isso não pode prosseguir ao infinito. Logo, deve haver um primeiro motor imóvel.

Ora, é certo e evidente aos sentidos que algumas coisas se movem. Tudo o que se move é movido por outro. [...] Mas não se pode proceder ao infinito, porque, assim, não haveria motor primeiro, e, portanto, nenhum outro motor, pois os motores intermediários não movem senão por serem movidos pelo primeiro motor. Logo, é necessário chegar a um primeiro motor que não é movido por outro; e este todos chamam Deus (AQUINO, 2003, p. 40).

Essa primeira prova busca demonstrar que o movimento exige uma causa que esteja fora da cadeia de eventos móveis, ou seja, algo que não receba movimento de outro, mas seja em si mesmo o início de toda a dinâmica do universo. Deus, nesse argumento, é o motor imóvel que fundamenta toda a realidade em movimento.

A segunda via: a causalidade eficiente

A segunda via parte da noção de causa eficiente. Nada pode ser causa de si mesmo, pois isso implicaria existir antes de si próprio. Como não se pode regressar ao infinito, deve haver uma causa primeira que seja "incausada".

Na ordem das causas eficientes, não se encontra nem se pode encontrar algo que seja causa eficiente de si mesmo, porque então seria anterior a si mesmo, o que é impossível. [...] Ora, suprimir a causa é suprimir o efeito. Se, pois, não existe uma causa eficiente primeira, não haverá causa intermediária, nem causa última, o que é manifestamente falso. [...] Logo, é necessário admitir-se uma causa eficiente primeira; e esta é Deus (AQUINO, 2003, p. 40-41).

Neste argumento percebemos que, sem uma causa primeira, a realidade como a conhecemos não existiria. Ele rejeita a ideia de regressão infinita de causas, pois isso tornaria impossível a existência das causas intermediárias e dos efeitos que delas decorrem. Deus, então, é compreendido como a causa primeira, a origem de tudo o que é causado.

A terceira via: o possível e o necessário

A terceira via se baseia na distinção entre seres possíveis (contingentes) e seres necessários. Os seres que vemos ao nosso redor são contingentes, ou seja, podem existir ou não. Ora, se tudo fosse contingente, em algum momento nada teria existido e, nesse sentido, do nada, nada poderia surgir (Ex nihilo nihil fit). Logo, deve haver um ser necessário, que tenha em si mesmo a razão de sua necessidade.

Vemos que há coisas que podem existir e não existir, pois nascem e perecem, e, portanto, são possíveis. Se tudo pode não existir, então em algum tempo nada existia. Mas se isso fosse verdade, nada existiria agora, pois do nada nada vem. [...] Portanto, nem todos os entes são meramente possíveis, mas é necessário que haja algum ser necessário. [...] E esse ser necessário, que tem em si mesmo a causa de sua necessidade, é o que todos chamam Deus (AQUINO, 2003, p. 41).

Ele mostra nessa via que se tudo fosse contingente, o mundo não teria começado. Algo precisa ter a existência por essência, isto é, ser necessário. Esse ser é Deus, o único que existe necessariamente e do qual todos os outros derivam sua possibilidade de ser.

A quarta via: os graus de perfeição

A quarta via utiliza os graus de perfeição. Tomás observa que há diferentes graus de bondade, verdade, beleza e nobreza nas coisas do mundo. Essa gradação só é compreensível se existir um grau máximo que sirva de parâmetro para os demais.

Entre os seres, há alguns mais e menos bons, verdadeiros, nobres etc. Mas mais e menos se dizem das diversas coisas conforme se aproximam de algo que é o máximo. [...] Logo, existe algo que é verdade, bondade e nobreza máximas; e, por conseguinte, o ser máximo. Ora, o que é máximo em um gênero é a causa de todos os que pertencem a esse gênero. Logo, existe algo que é causa do ser, da bondade e de toda perfeição em todos os seres; e isso é o que chamamos Deus (AQUINO, 2003, p. 41-42).

Com isso, Tomás afirma que todo grau de perfeição remete a um padrão absoluto. Se há coisas mais ou menos boas, isso só é possível porque existe algo que é a própria bondade, o próprio ser pleno. Deus, nesse caso, é o ser absolutamente perfeito que serve de medida e origem de toda perfeição no mundo.

A quinta e última via: o governo das coisas

Esta última via, antes de citá-la, devo ressaltar que ela é de base teológica, uma vez que ela parte da observação de que os seres irracionais agem com finalidade, como se fossem guiados por um propósito. Isso indica que há uma inteligência por trás da ordem da natureza.

Vemos que as coisas que carecem de conhecimento, como os corpos naturais, operam por um fim. E isso se mostra em que sempre ou quase sempre agem do mesmo modo para alcançar o que é ótimo. [...] Ora, aquilo que não tem conhecimento não tende a um fim senão dirigido por algum ser conhecedor e inteligente, como a flecha é dirigida pelo arqueiro. Logo, existe um ser inteligente pelo qual todas as coisas naturais são ordenadas a um fim; e esse ser é o que chamamos Deus (AQUINO, 2003, p. 42).

Aqui, Tomás defende que, se a natureza segue leis e finalidades, mesmo sem consciência, então essa ordem deve provir de uma mente inteligente. Assim como uma flecha não acerta o alvo sem um arqueiro, a natureza não se dirige a fins sem um princípio racional que a governe. Deus é, portanto, o grande ordenador do cosmos.

Bom, Tomás identifica em cada um desses aspectos um ponto de partida para inferir a existência de um ser necessário, perfeito, eterno e inteligente: o que chamamos Deus. Essa discussão é muito importante, uma vez que o diálogo entre fé e razão foi motivo de muitas discussões e muitas vezes consideradas heresias por parte da igreja no período medieval, sobretudo as reflexões tomistas que são de base aristotélica, um autor pagão. Enfim, o objetivo do texto, é mostrar ao leitores de fé que é possível crer de maneira racional e não apenas através de um sentimento cego.

Tremedal - BA, 28 de julho de 2025.


Referência:

AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. Tradução de Luiz João Baraúna. Volume I – Parte I, Questão 2, Artigo 3. São Paulo: Loyola, 2003.

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